sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Pesadelo

D. Isaura numa noite fria e pacifica, acorda com um pesadelo.
Humedece os lábios, pisca os olhos, e levanta-se. Corcunda, com uma manta sobre as costas, os olhos semi-cerrados, e os óculos na ponta do nariz coça a cabeça e pensa:- Para que serve “o pensar” se a vida corre “a toque de caixa”?

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

s/ titulo

Ele quebrou a minha respiração falhada.
Quando toda a saudade é a saudade do amor.
Para quê tentares eternizar a culpa em ti?
Aquele amanhecer queimou a inocência e a surpresa do gosto
Bebo e desperto em mim, a sede que nos vai devorando sem medo de avançar.

Nasceu sem saber ao certo de que forma haveria de crescer.

sábado, 27 de setembro de 2008

Esvoaçar

Nascendo, crescendo, vivendo, reproduzindo, envelhecendo, e morrendo. Numa estimativa de 85 anos, porque não arranjámos ainda uma maneira de criar, um humano com asas? Que esvoaçasse entre os 10 e os 18, e voasse de vez a partir daí, até aos 70, ou até a idade em que as penas, e a força se mantivessem. Que os ninhos fossem quentes, e sempre confortáveis. Que os membros da família se fossem quando menos bem - vindos. Que os filhos adolescentes fossem e só voltassem quando tivessem força nas asas. Que quando fosse preciso voar para mais longe, fosse mais fácil de aceitar para os outros.
Como será sentir asas nas omoplatas?
Abri-las, esticá-las como quem espreguiça.
Ver o que nos rodeia, sentir o vento, e saltar olhando sempre em frente.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

s/ titulo

Presa a uma razão maior, que não me larga nem a mim, nem a nenhum ser vivo habitante neste (por vezes) triste e lamentável mundo.
Foi lamentável, tristemente agoniante ter de largar a floresta com luz própria, com animaizinhos contentes aos pulos, com joaninhas a esvoassar, com cantares de passarinhos. Aquele ar que me preenchia o peito e me fazia levantar os pés do chãos sem querer.
Para vir acabar, entre paredes "amarelo entristecido", com agulhas encarnadas nas veias, com barulhos e silêncios perturbadores. A unica hipotese é ocupar de vez este corpo medicalizado, e sobreviver, ou talvez não, e nunca mais voltar ao ninho...

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Vestido


Vivia triste, recolhida no seu cantinho de costura, a Alisa.
Cabisbaixa continuava alinhavando, unindo, juntando, “cosendo” um tecido ao outro.
Termina, coloca as mãos nas ancas, empurra-as para a frente, tentando esticar a encurvada coluna, nela encarnada. Dá dois passos curtos, e olha para um vestido a meio fazer. Ali pousado, duas partes do
mesmo tecido, unidas, e sem vida Pensou: Numa mulher, tem vida, cor, e temperatura. E aqui!?


segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Jacinto

Jacinto era fácil de se amar.
Mas pouco se interessava por mulheres. Apenas por divindades, esbeltas e quase translúcidas.
Numa primavera cruzou-se com a Brisa fresca do Oeste.
Apetecia-lhe abraçá-la, mas não tinha oportunidade.
Por razões óbvias, á volta deles existiam muitas mas muitas pessoas, ouviam-se conversas paralelas, crianças a espernear e cantares desafinados. Ele não queria que os vissem abraçado a uma Brisa.
Ela era linda, pausada, calma, franca, sorridente, e boa de se amar.
Jacinto queria transmitir-lhe a química, a energia que o levou até ela. Mas Brisa, tinha um anel no dedo anelar esquerdo, e não o podia enferrujar com tentações alheias.Existia cumplicidade entre ambos. A única forma que tinham de se encontrar, era combinar a noite e hora a que se encontrarião em sonhos.

sábado, 28 de junho de 2008

"Ver é compreender"

“Cada um de nós vê as coisas de modo diferente. E essa diferença vai determinar, na prática, uma variedade significativa de modos de fazer. Uma variedade nas soluções que cada um de nós encontra para transmitir aos outros a experiência do mundo que nos rodeia.A destreza do fazer está relacionada com a qualidade do ver e os objectivos poéticos ou funcionais que se pretendem atingir.”

Rocha de Sousa
DESENHO Área: Artes Plásticas
IV Volume
Edição - Ministério da Educação, Secretário do Estado do Ensino Superior.
1980 +/-
(Também conhecido como TPU 19)





Estabeleci em mim uma procura, pela expressão por palavras duma linguagem plástica. O desenho.Como se fala do desenho? Qual o seu vocabulário? Quais os seus adjectivos para caracterizar modos de representação plástica?Aconselharam-me um livro que já não se vende, e muito difícil de o encontrar em alfarrabistas ou em feiras. Alcancei-o de uma mão, com poder de propagação, e inteligência. Mão essa professora, conhecedora das "necessidades" dos “artistas em geral”.
O livro transparece a necessidade que o autor teve em “clarificar”, através da organização dos elementos estruturais da linguagem plástica,(ex:textura,cor,valor lumínico forma,linha,ponto,movimento,ritmo etc) todos distintos mas relacionáveis,dá-nos uma definição detalhada de cada um desses elementos.Termina-se a leitura com a aprendizagem: Conseguir falar do desenho. Entender o desenho. Ver, melhor o desenho,através das palavras.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Carta de Matilde para José


Caro José, antes de mais pergunto-me se estará tudo bem contigo,como passarão teus dias sem mim?
Lamento ter de distribuir os meus sentimentos mais profundos por uma folha de papel, e ter de a enviar dentro de um envelope.Talvez assim me consigas entender, e até sentir como tenho ficado sem ti.
Amar não é bom se houver no fundo de um de nós alguma solidão.
As palavras são a melhor forma que temos de nos exprimir,partilhar,transmitir. Tu próprio o afirmas. Trasmiti-te pessoalmente exactamente o que pretendia, mas por três vezes senti-me e sinto-me pouco ou nada compreendida.
Tenho emoções em mim que me carregam o andar. Que me entristessem repentinamente, pela falta da presença de alguém. Não é "a vida" que quer que as coisas sejam assim, somos nós que as fazemos desenrrolarem-se assim. Dizem-me que o amor só é grande e forte se for triste. Lamento mas não partilho da mesma opinião. Amar é ser feliz contigo, juntamente com a paixão, a companhia,a surpresa, a conversa, a presença, e tudo isto constitui o amor...
Mas ser amado já será secundário... não é?
Oxalá me entendas com cartas.

Beijo

Matilde Santos

terça-feira, 3 de junho de 2008

Tenho um teatro na cabeça

A minha cabeça é o urdimento, nele tenho a teia com tudo o que é necessário para fazer aparecer e desaparecer telões, cenários, pernas, bambolinas projectores entre muitos outros órgãos fundamentais á minha existência. Lá dentro tenho um sem número de cordas, roletes, roletes de descarga, organizadamente dispostos.Na testa tenho a bambolina régia, no canto dos meus olhos, tenho as pernas régias. Para trás tenho muitas outras pernas que “engolem” e “cospem” os chamados artistas. Na orelha esquerda tenho sistemas de contrapeso que içam pesos brutos, com o mínimo de esforço.Na boca tenho quarteladas versáteis com caimento, no queixo tenho o proscénio.Com tudo isto sou capaz de armar a cena *.


* Armar a cena – Fazer a montagem de um dispositivo cenográfico.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

s/ titulo

Tinha um andar descompassado,coxeava ligeiramente...tinha a pele suave,movediça, e quente com um sabor intenso,salgado e envolventemente aromático.
Os homens esperam vê-la!
A verdade, é que se pode simplesmente ouvi-la... cheirá-la... tocá-la... ou saboreá-la!

terça-feira, 27 de maio de 2008

Se...


Se ouvisse, ouvia a teu grito cujo fim não é senão o da expressão da dor intensa que me provocas.

Se vivesses, não tinhas mostrado a decadência progressiva do teu corpo "medicalizado".

Se pudesse ter-te aqui, abraçava-te apertadamente.

Clara,coração de pássaro


Clara,sonhou numa noite ter voado

era conhecida pelo coração de pássaro nela entranhado.


Clara,é mulher

deseja,precisa e quer

Mas,não tem um ritmo cardíaco qualquer.


Por detrás do monte de granito apareceu

O homem que a levou

pela ravina ensinou

a sua 1ª aula de voo.


Azul perto




A tranquilidade está presente em cada rebentar de onda.

Pequenos,mas muitos grãos de areia entre os dedos.

Se eu pudesse...




Se eu pudesse ter asas...


Voava para longe,ía,e ficava.


Sem ter de voltar na próxima Primavera...